segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Empenhos liquidados que excedem as disponibilidades financeiras podem ser cancelados ou anulados?

CONSIDERAÇÕES LEGAIS E TÉCNICAS

Para elucidação do assunto consultado é importante o entendimento dos Restos a Pagar, como trata a Lei 4.320/64:

“Art. 36 - Consideram-se Restos a Pagar as despesas empenhadas mas não pagas até o dia 31 de dezembro, distinguindo-se as processadas das não-processadas.
Parágrafo único. Os empenhos que correm a conta de créditos com vigência plurianual, que não tenham sido liquidados, só serão computados como Restos a Pagar no último ano de vigência do crédito”.

São considerados processados os Restos a Pagar referentes a empenhos executados, liquidados e, portanto, prontos para pagamento, ou seja, o direito do credor já foi verificado.

São considerados não processados os empenhos de contratos e convênios que se encontram em plena execução, não existindo ainda o direito líquido do credor.

Entendemos, que a questão maior sobre o assunto em estudo, diz respeito ao princípio do equilíbrio financeiro, e este deve obedecer às regras da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/00):

“Art. 9º - Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subseqüentes, limitação de empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias”.

Para evitar os desequilíbrios, a mesma Lei de Responsabilidade Fiscal, criou a seguinte vedação:

“Art. 42 - É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito”.

É mister ressaltar o conceito de disponibilidade de caixa trazido no parágrafo único do artigo acima:

“Parágrafo Único. Na determinação da disponibilidade de caixa serão considerados os encargos e despesas compromissadas a pagar até o final do exercício”.

Neste caso a disponibilidade de caixa não se confunde com a expressão saldo financeiro em conta, existente no dia 31 de dezembro do último ano de mandato. Devemos, portanto, entende-lo, exemplificando:

+ Saldo financeiro (Disponibilidades em Caixa e Bancos)
(-) Encargos e despesas compromissadas (Dívida Flutuante)
= Disponibilidade de Caixa

Este, portanto, é o resultado a ser considerado para acobertar os Restos a Pagar.

E, para penalizar àqueles que desobedeçam ao descrito nos artigos acima citados, a Lei 10.028/2000, sentencia:

Para a não limitação de empenhos que trata o artigo 9º da LRF:

“Art. 5º - Constitui infração administrativa contra as leis de finanças públicas:

III – deixar de expedir ato determinando limitação de empenho e movimentação-financeira, nos casos e condições estabelecidos em lei;

Multa de 30% dos vencimentos anuais do agente que lhe der causa.”

Para a desobediência ao artigo 42 da LRF:

“Art. 359-C. Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura, cuja despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou, caso reste parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos”.

E finalmente encontramos ainda na Lei 10.028/2000, o artigo que segue:

“Art. 359-F - Deixar de ordenar, de autorizar ou de promover o cancelamento do montante de restos a pagar inscrito em valor superior ao permitido em lei:

Estará sujeito a pena de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, de detenção”.

CONCLUSÃO

A regra geral é que a partir da entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, os Srs. Gestores Públicos, não poderão contrair despesas que não possam ser pagas dentro do seu período de gestão, salvo as exceções previstas em Lei.

Para tanto é indispensável que exista planejamento. Este poderá ter seu início, trinta dias após a publicação do Orçamento do Município, com a edição por Decreto do Executivo, da Programação Financeira e do Cronograma de desembolso e bimestralmente analisados os resultados e observado que as despesas excedem as receitas previstas, deverão ser limitados por Decreto Executivo para que não se recorre as inscrições em restos a pagar.

Inexistindo todos os cuidados indispensáveis para o equilíbrio financeiro, entendemos que:

A anulação de empenho será efetivada quando maculado de ilegalidade, a exemplo de processo administrativo licitatório realizado fora das condições normais.

Na anulação, decorrente de ato ilegal, o fornecedor perde o direito de recebimento. Ato nulo não gera direito.

Enquanto o cancelamento do empenho pode ser efetivado por motivos de conveniência e oportunidade vislumbrada pela Administração Pública, em observância ao princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, desde que devidamente fundamentado.

Para a fundamentação é necessário o estudo caso-à-caso.

O cancelamento deverá ser formulado por Decreto.

Ressaltamos que o cancelamento do empenho não significa a perda do direito do fornecedor, visto que, a liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

Tratando-se de dívidas do Município estes empenhos cancelados, poderão ser reempenhados pelo sucessor, devendo ser observada a ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, atendendo ao art. 5º da Lei 8.666/93 e as disposições do Decreto–lei nº 201/67.

Deve-se observar se estas despesas empenhadas e liquidadas foram realizadas nos dois últimos quadrimestres, caso este fato seja confirmado, o novo Gestor deverá patrocinar em nome do Município uma ação de Improbidade Administrativa e uma Ação Penal, contra o ex-Gestor.

Este é o parecer,

S.M.J.

José Vanderlei Leal

Bibliografia:

- CASTRO, José Nilo de. Responsabilidade fiscal nos municípios. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
- ANDRADE, Nilton de Aquino. Contabilidade pública na gestão municipal. São Paulo: Atlas, 2002.
- FILHO, José Guilherme Soares. Lei de responsabilidade fiscal: um guia legislativo para as finanças públicas, o orçamento e a prestação de contas. Rio de janeiro: DP&A, 2001.
- MACHADO JR, José Teixeira; REIS, Heraldo da Costa. A lei 4.320 comentada: com a introdução de comentários à lei de responsabilidade fiscal. 30. ed. Ver. Atual. Rio de janeiro, IBAM, 200/2001.